Webinário – “A comunicação na sociedade e na escola, formação e uso”

 

José Esteves Rei, no Dia Internacional da Educação: “Agarrar os alunos a nível comunicacional é o grande desafio”

A FNE e a AFIET (Associação para a Formação e Investigação em Educação e Trabalho) celebraram a 24 de janeiro, o V Dia Internacional da Educação, com um webinário alusivo ao tema “A comunicação na sociedade e na escola, formação e uso”, que contou com o Professor Catedrático aposentado José Esteves Rei (Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro) como orador principal e com o Professor Doutor Rui Maia (Centro de Formação da FNE) e Joaquim Santos (Secretário Nacional da FNE) na moderação.

Coube a Joaquim Santos fazer a contextualização político-sindical do Dia Internacional da Educação, que a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou em 3 de dezembro de 2018, com o objetivo de assinalar o papel da educação para a paz e o desenvolvimento dos povos.

De seguida, José Esteves Rei tomou a palavra e começou por apresentar o plano da sua apresentação. O primeiro ponto referiu-se à visão abrangente da comunicação verbal e dos seus primórdios, que abriu cerca de uma hora de partilha de conteúdos relevantes e indiscutíveis sobre a história e o papel da comunicação na sociedade.

A eloquência da comunicação não verbal, a forma como as nossas palavras ganham significado diferente de acordo com o tom de voz que usamos ou a nossa linguagem corporal, são uma combinação de sinais que influenciam o impacto da nossa forma de comunicar. 55% do impacto da apresentação é feito pela nossa linguagem corporal, gestos e contacto visual, 38% pelo tom de voz e 7% pelo verdadeiro conteúdo da apresentação.

O exemplo apresentado por Esteves Rei para este caso situou-se na tomada de posse de Lula da Silva, de 1 de janeiro, em que a sua esposa, Janja da Silva, optou por um look diferente do habitual em primeiras-damas. Trocou o vestido habitual por um conjunto de fato cor de champanhe, da designer Helô Rocha, com bordados feitos em parceria com bordadeiras do nordeste do país.

“Queria vestir algo que tivesse simbolismo para o Brasil, para os estilistas, cooperativas e para as mulheres brasileiras“, disse Janja. Isto foi por muitos considerado como uma quebra de paradigma na mensagem comunicacional que ali foi transmitida. Para Esteves Rei “as palavras são importantes. Todavia, a forma como elas são apresentadas e a expressão corporal que as acompanha transformam-nas em magia. O homem, porém, exagerou a importância da palavra, como se esta constituísse o todo comunicacional, esquecendo outros aspetos determinantes”.

Mas também Aristóteles foi citado nesta iniciativa na questão da importância (do estudo) da comunicação, em que o filósofo grego defendia que “a comunicação / a Retórica anda ligada ao conhecimento comum. Todas as pessoas recorrem a ela, para questionar ou defender um argumento […]. Todavia, umas fazem-no ao acaso e outras pela prática, resultante do hábito”.

Já Marquês de Pombal, no séc.XVIII considerava que “Não há ensino mais útil que o da Comunicação (a Retórica) porque ensina a falar […] orienta os pensamentos e a sua distribuição e o ornato. Deste modo, ensina os meios e artifícios para persuadir os ânimos e atrair as vontades”.

Esteves Rei citou vários filósofos ao longo da sua apresentação e outro deles foi o francês Paul Valéry, defensor da existência de várias línguas para contactar com demais pessoas e contextos, usando o mesmo vocabulário e a mesma sintaxe relativamente à questão “Donde nasce a dificuldade em comunicar?”. O orador convidado citou depois alguém que é uma referência na sociologia: Pierre Bourdieu, que considerava que não basta falar bem, mas sim falar a propósito, isto sobre “Critérios de bem falar para grupos”.

Voltando ao caso português, o antigo professor da UTAD referiu que nos anos 60-70, e falando de Comunicação Empresarial, dá-se a grande mudança, na indústria e nos serviços. Entre 1950 e 1970, assiste-se em Portugal ao desenvolvimento da indústria e da economia, o que aumenta as relações de contacto direto, isto é, de comunicação interpessoal de largas camadas da sociedade.

A imprensa também ganhou, por todo o lado, mais destaque com o surgimento do jornal, muito sob o signo do engano após 1640, para mostrar que a luta da independência iria melhor do que estava indo. A leitura do jornal foi sempre denegrida pela cultura e pela escola: seria perda de tempo, veículo de mentiras, desvio de leituras sérias, um veículo de saber desconexo.

“A comunicação social emerge da escola e, por uma vez, a escola à frente da sociedade?” questionou Esteves Rei. “Sim e a imprensa escolar esteve muita viva na 1.ª metade do século XX. O colégio jesuíta de Santo Tirso manteve o jornal “O Nosso Colégio” de 1904 aos anos 70. Com os seus artigos juvenis, nele deram os primeiros passos na escrita gradas figuras de todos os setores da sociedade, como os Irmãos Pinto da Costa, na ciência e no desporto, Luís Sttau Monteiro e Ary dos Santos na literatura”.

Daí surgiu o I Encontro da Imprensa Escolar, que concluiu que tinha de ser criada uma escola de jornalismo, cuja falta tanto se faz sentir no país; que fosse estudado e elaborado um ‘Estatuto da Imprensa Escolar’; que fosse publicado quanto antes, e fornecido a todos os núcleos de Jornalismo, o “Manuel de Jornalismo Escolar”; que se instituam bolsas de estudo, para professores e alunos com estágio; que se realizem periodicamente cursos de Jornalismo para dirigentes a nível nacional e regional – extensivos aos alunos. Esta era uma pequena revolução na forma de comunicar através da imprensa e que ganhava força através das escolas.

Mas só nas décadas de 1980 para 1990 é que a comunicação entra no ensino superior em Portugal. Muitos professores de línguas, filosofia, sociologia, psicologia fazem um enviesamento nas suas formações e carreiras para satisfazer para satisfazer essa carência socioeducativa. Tivemos então uma revolução comunicacional. Foi o que se fez em Portugal nos últimos 50 anos – acontecimento pelo qual passaram outros países bem antes de nós: da família à escola, da comunicação social à empresa, das instituições ao relacionamento interpessoal.

Entre os pressupostos temos a alfabetização universal dos anos 50, com o surgimento e expansão da empresa, como forma de organização do trabalho, a ponto de hoje trabalhar significa trabalhar em organização, com o desenvolvimento em todos sentidos das organizações: clubes, sindicatos, associações, ligas – profissionais ou de lazer.

A temática do webinário rumou depois para o campo do papel da literatura como forma de comunicação. Haverá uma comunicação literária? Como caracterizá-la? Esteves Rei fez-se valer do escritor francês Yves Vadé, que dizia que se tratava “de uma comunicação mágica: o que veicula não é da ordem do sentido ou da lógica, mas do âmbito pulsional – produz perturbações como prazer, angústia, êxtase, agressividade”. Comparando com a matemática, “a comunicação literária é mágica, não é racional; o seu conteúdo situa-se na fantasia, no imaginário, num mundo de coordenadas diferentes das do mundo social”.

Qual então a finalidade da comunicação literária? A literatura e a comunicação literária entranharam-se, desde sempre, na vida dos homens, que não deixaram indiferentes muitos filósofos, revelando posições muito diversas sobre elas.

Platão preocupa-se com “a praxis orientada para o sucesso”, ético e pessoal. As limitações da literatura e da comunicação literária estão nelas, porque apresentam as atitudes e as ações das personagens sem as questionarem, aceitam as normas sem as problematizarem.

Mas o seu discípulo, Aristóteles, autor de uma teoria do Estado, “aplica à comunicação literária e à literatura, objetivos políticos: garantem o descanso das grandes massas e suprimem as tensões entre os grandes estratos da população. O recetor deixa-se dominar por aquilo que é representado na obra literária, de tal forma que se esquece de si próprio e do seu mundo. Submerge no mundo “da bela aparência, da verosimilhança, de modo que o mundo de sofrimento que o envolve, com as suas representações e normas, deixa de existir”, citou a respeito Esteves Rei do filósofo grego.

A fechar esta iniciativa que marcou o V Dia Internacional da Educação, falou-se de escola e se ensinar é comunicar. Para o orador convidado “ensinar é comunicar. A comunicação é uma transferência de informações que fazem reagir os semelhantes em comportamento-resposta adequado à mensagem”. E é por isso que uma aprendizagem eficaz se consegue através do ensino a outros, seguido da prática no terreno e da discussão como principais formas de alcançar essa eficácia na aprendizagem.

Na parte final do webinário, o Professor Esteves Rei respondeu a algumas questões colocadas pelos participantes sobre a forma como os professores devem gerir e lidar com a comunicação, deixando um alerta: “A comunicação veio para ficar. É preciso distinguir a comunicação em cada contexto, mas o grande desafio que o professor enfrenta na escola é agarrar os alunos a nível comunicacional”.

Neste âmbito, e em jeito de homenagem, dedicou este webinário ao Professor Óscar Lopes, orientador da sua tese de mestrado, nos anos 70 e que dizia: “Eu até tenho obrigação de ser feliz! Gosto do que faço… e há gente que me ouve sobre aquilo que eu faço!”.

Fonte: https://fne.pt/pt/noticias/go/webinarios-webinario—-a-comunicacao-na-sociedade-e-na-escola-formacao-e-uso

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