Nos últimos 4 anos tenho me equilibrado entre as carreiras de executivo e docente pós-graduação de marketing e vejo que o mundo do marketing e o mundo da educação são muito mais parecidos do que imaginava inicialmente.
Este ensaio é uma conversa entre o docente e o executivo pelo propósito do desenvolvimento do líder contemporâneo.
1. Tudo começa pelo “QUEM” e pelo “PORQUÊ”
A lógica da criação de valor em Marketing começa pela identificação de um segmento alvo, de uma persona, e do entendimento das motivações de compra e consumo de uma determinada oferta. Ao entendermos o que as pessoas buscam em termos funcionais, sociais e psicológicos, estamos mais habilitados para desenharmos propostas de valor relevantes (Christensen, 2016).
Na Educação, para projetarmos um curso, um programa e, consequentemente, aulas, precisamos compreender o perfil do aluno ingressante e o perfil do egresso desejado. Precisamos conhecer a bagagem trazida pelos estudantes, seus desafios profissionais atuais e futuros e como a disciplina em desenvolvimento poderá contribuir para que eles atinjam seus objetivos. A partir deste entendimento, conseguimos ajustar o programa, a estratégia e escolha dos métodos (Machado, 2011).
Assim como o entendimento do consumidor deveria preceder a definição de um produto, o conhecimento do perfil dos alunos preceder as definições da aula. Assim como o produto pode ser cocriado com as pessoas, as aulas são cocriadas com alunos (Anastasiou & Alves, 2009; Kotler et al., 2017).
2. Mas o “O QUE” e o “COMO” no final das contas é o que faz a diferença
Uma pessoa específica, com determinada motivação, compreende com profundidade os conceitos, as ferramentas e suas aplicações práticas; entende o mercado, as necessidades e desejos dos consumidores, conhece as tendências e é capaz de imaginar o que está por vir…tudo issoper senão produzirá valor se o conhecimento não foi mobilizado para a realização de algo. A motivação, o conhecimento e as habilidades são equivalentes a parte oculta de um iceberg que se torna visível apenas frente a ação.
Para um Profissional de Marketing é insuficiente identificar as oportunidades. A pessoa de marketing precisa ser capaz de propor planos, mobilizar recursos, executar de forma flexível e resiliente, monitorar a evolução e o resultado e propor ajustes. O trabalho de marketing que vale a pena é aquele que chega ao mercado e gera valor para consumidores e clientes, para a organização e a sociedade como um todo. Uma linda apresentação não cria valor (Finch et al., 2013; Schlee & Karns, 2017).
Para Educação o valor criado está não só na comunicação do conhecimento, mas na transformação do aluno no sentido de conhecer os novos conhecimentos, saber quando e como usá-los e como conectá-los com a problemáticas das questões reais, numa vida sem enunciado. O aprendizado só faz sentido quando causa uma transformação na prática, seja na mudança de uma lógica, na capacidade de conexões amplas, seja num ponto de vista mais crítico (Bacellar & Ikeda, 2006; Bacon, 2017).
3. E onde o líder contemporâneo entra nessa conversa?
Ele entra aqui mesmo.
No passado o líder se aproximava do herói, decidindo e resolvendo, inspirando o time pelo histórico de sucesso e pela ascensão rápida. Para esse herói, ter uma bandeja servida de análises e uma equipe com menos ação era muito confortável, gerando uma atmosfera propícia para seus golpes certeiros.
Contudo, frente a evolução da gestão e mudança no comportamento das pessoas na direção de modelos mais colaborativos, emerge um novo líder. Um líder mentor, que trabalha pelo desenvolvimento das pessoas para que as soluções emerjam delas.
O líder contemporâneo trabalha pelo desenvolvimento de competências para que as pessoas desenvolvam então “inteligência prática para situações que se apoiam sobre os conhecimentos adquiridos e os transformam com mais força na medida em que aumenta a complexidade das situações” (Galli, 2012, p.59). As competências não habitam apenas a dimensão saber fazer, envolvendo também a noção de desejo e apetência, o conhecimento dos meios e recursos e a capacidade de mobilizar o que é necessário para realizar o que se deseja. Envolve pessoalidade, âmbito e mobilização (Machado, 2016).
A função desse novo gestor em muito se aproxima da função do docente atual, que mobiliza os recursos disponíveis para ajudar o outro na construção de competências. Ambos se aproximam na missão de ajudar seus liderados a tomarem melhores decisões, não só para as empresas como também para a sociedade como um todo.
*Alexandre Salvadoré Doutor, Mestre e Bacharel em Administração de Empresas pela FEA-USP.