Por Pedro Lourenço, CEO & Founder da Consumers Trust e Embaixador da Comissão Europeia para os Direitos do Consumidor
Já não há quem não conheça o poder de ter o Google à mão, para tomar uma decisão de compra mais consciente e informada. E já não destaco a comparação de preço, pois essa possibilidade há muito que é intrínseca aos consumidores. Estou a falar da capacidade de o consumidor poder “tirar a limpo” toda e qualquer dúvida que possa ter em relação a uma marca, serviço ou produto.
Aquilo que foi, durante décadas, o grande poder das marcas em comunicarem unidireccionalmente com os seus clientes, através de uma mensagem presunçosa, por se considerarem as melhores e as mais confiáveis – sem qualquer tipo de avaliação externa -, começou a esvanecer-se com o aumento da digitalização dos consumidores e o crescimento das comunidades online de partilha de experiências. O poder de eleição passou para as mãos dos internautas, dando lugar à transparência, ao exporem as fragilidades e vulnerabilidades das grandes marcas, que não estavam habituadas a este tipo de escrutínio.
A experiência do consumidor digital mudou muito, ao longo dos últimos anos. Isso é certo! Mas, que tendências continuarão a mudá-la no futuro e como essas mudanças afectarão a forma como as marcas irão interagir com os seus clientes?
A experiência do cliente do passado e do presente
As maiores mudanças na experiência do cliente, ao longo da última década, foram as circunstâncias como os clientes interagem com as marcas. A personalização da experiência não é algo propriamente novo; a Amazon já oferecia, no final da década de 90, recomendações personalizadas no seu site, no entanto, esses esforços de personalização eram minimalistas. No entanto, é através do massivo crescimento das redes sociais e da utilização de smartphones, que alcançamos nos dias de hoje, uma inigualável hiperpersonalização da nossa experiência de consumo, ao ser possível a sugestão imediata de produtos compatíveis com as nossas preferências, apenas com base na nossa navegação e em compras anteriores.
A Amazon, por exemplo, sabe se os seus clientes são membros Prime, bem como os filmes que provavelmente querem ver, os produtos que têm estado a pesquisar, e os artigos que compraram no passado e que provavelmente voltarão a comprar num futuro próximo. Quando um cliente da Amazon recebe um e-mail com artigos que lhe possam interessar, é muito provável que este o leia, bem como clique nas sugestões apresentadas. Se a Amazon solicitar que os clientes avaliem os produtos que compraram, estes estarão normalmente mais inclinados a fazê-lo, pois reconhecem que muitos outros clientes utilizam essas avaliações para decidir se compram ou não um determinado produto.
A experiência do cliente está hoje para a reputação, como estava, no passado, o marketing de vendas para a notoriedade, e por isso, esta passou a ser a moeda de troca entre ambas as partes – os consumidores e as marcas.
Todavia, a personalização não foi a única alteração comportamental na experiência dos consumidores. Devido à pandemia, nasceram os novos consumidores “sempre online”, que mudaram a forma como fazem as suas compras. Durante o confinamento, as pessoas não queriam entrar nos supermercados, nem estar em contacto com outras pessoas, pelo que começaram a fazer as suas compras através da internet. Não só podiam comprar produtos e mercearias através de um site ou numa aplicação móvel, como também podiam ter a encomenda entregue à sua porta, sem a necessidade de se deslocarem à loja. Quando os consumidores se aperceberam desta conveniência, continuaram a fazê-lo mesmo depois da pandemia acabar. Reflexo disso, foi o exponencial aumento na utilização de aplicações de entrega de refeições como o Uber Eats, mesmo depois da possibilidade de voltar aos restaurantes.
Aumento da expectativa e menos paciência
Com estas alterações comportamentais, os consumidores passaram a ser mais exigentes, esperando mais assertividade por parte das marcas e mais disponibilidade para uma resposta imediata às suas necessidades, ao terem expectativa de que o digital passará a estar cada vez mais presente na sua jornada como clientes.
Segundo o Digital 2023 Global Overview Report relativo a Portugal, 85,1% da população portuguesa está online, o que demonstra uma quase total disponibilidade destes para interagirem entre si e com as marcas, num ambiente totalmente inovador, isento e transparente, onde o poder das marcas já não é exercido da mesma forma que outrora. Desde a pandemia, que os clientes têm aumentado exponencialmente as suas interacções digitais com estas, passando a esperar que o serviço ao cliente esteja disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, em todos os canais onde a marca está presente, permitindo-lhes utilizar a escolha preferida de meio. Esta nova circunstância, passou a exigir das marcas uma maior disponibilidade digital dos seus serviços. A maioria das organizações tem estado a caminho de evoluir para uma mentalidade mais digital, contudo, o caminho ainda é longo, pois exige igualmente que as suas administrações, chefias e colaboradores efectuem o mesmo percurso. Quem ainda não deu este passo em frente, dificilmente conseguirá fazê-lo com consistência e terá certamente um futuro muito idêntico à trágica história da Kodak e da Blockbuster.
A reputação como validador de confiança
Apesar das crescentes expectativas dos consumidores, para muitos, a experiência do serviço ao cliente não tem acompanhado o ritmo da digitalização. Um estudo recente do Portal da Queixa by Consumers Trust de 2022, revelou que 60% dos consumidores pensam que o serviço de apoio ao cliente é hoje, pior do que era antes da pandemia. O desinvestimento na formação de uma cultura interna de atendimento, capaz de ir ao encontro das expectativas e necessidades dos clientes, tem causado um enorme aumento das reclamações partilhadas publicamente, que impactam directamente com a reputação das marcas em ambiente digital. Por sua vez, temos assistido a uma mudança de estratégia dos departamentos de marketing das empresas, ao investirem recentemente em indicadores, pouco credíveis, de reputação, que resultam de inquéritos de satisfação por parte de empresas de consultoria de mercado. Escusado será dizer, que nenhum consumidor irá partilhar a sua real satisfação, quando questionado acerca de uma determinada marca, sob a contrapartida de um reward relativo à sua partilha de opinião. É perfeitamente concebível que apenas partilhemos a nossa verdadeira opinião, quando temos a necessidade de resolução de um problema e que isso contribua para forçar a acção da marca nesse sentido. Acrescento que, numa breve consulta etimológica do conceito de reputação, esta é descrita como “uma avaliação social do público em relação a uma pessoa ou uma organização”, o que demonstra claramente que representando “o que dizem de nós”, os indicadores de reputação devem ser apenas aqueles que resultem da experiência do cliente e não uma mera opinião.
Não obstante à necessidade de adaptação aos novos tempos, este novo paradigma, vem reforçar esta nova tendência, que veio para ficar. Há uma nova disciplina no marketing empresarial que é o da reputação e não será de fácil aquisição, pois trará novos desafios às organizações para a construírem sob credíveis e transparentes indicadores, sob pena de serem facilmente desmascarados publicamente. Vamos assistir ao que os novos tempos nos trarão. Até lá, the Customer Success is the new marketing!
Fonte: https://marketeer.sapo.pt/e-assim-nasce-a-era-do-marketing-de-reputacao/